Por David da Costa Coelho
A função de alguns homens na vida é seguir seu próprio destino, muitas vezes isso os coloca contra os desejos de sua família, pois sabem o que seriam melhor para eles, no entanto, quem nasce com sua vida definida ainda no útero materno, jamais muda de ideia, mesmo que isso lhe custa à sanidade ou seu motivo de viver...
Hernandez Rivera, o pai de Fernando, era um rico criador de cavalos, uma tradição familiar há gerações. Ele passou a vida inteira atrás dos melhores garanhões que existiam na terra, e quando não podia comprar o animal, pagava verdadeiras fortunas pelo sêmen, e com ele inseminava suas éguas de raça, e anos depois ele tinha um novo troféu. Após muitas décadas de compras, conseguiu um fato inusitado, se tornou o maior possuidor de cavalos de raça do mundo. Além disso, tinha um banco de esperma e material genético para clonagem que valia milhões de dólares. Essa vida específica fez com que ele deixasse para ser pai bem mais tarde. Somente aos 50 anos ele foi pai pela 1ª e única vez... Fernando era o seu orgulho e herdeiro, planejou toda a vida futura do menino, desejava para ele o prosseguimento de sua amada profissão e prazer de vida. No entanto, quando o rapaz chegou aos 20 anos, só se interessava por sexo, orgias de sexo e gastar milhares de dólares numa noitada.
Seu pai entendeu aquilo como uma fase da juventude, portanto, decidiu não pressionar o garoto. Contudo, diferente do que desejava, a vida mundana e sem sentido do rapaz não terminou, aos 30 anos ele ainda se comportava como se ainda tivesse 20. Nunca mais foi aos haras ver o negócio da família. Ao contrário, agora havia entrando num ramo mais interessante, adquirir peças raras de épocas distantes, geralmente furtadas de locais sagrados, museus ou coleções particulares. Seu prazer estava em obter lucro com negócios escusos, aquilo era que dava sentido a uma vida de quem já nasceu sem precisar de nada. Um belo dia ele recebeu uma proposta muito libidinosa, era a compra de sêmen de um cavalo que seu pai desejava há anos, mas o dono dele Rodrigo de Castilho Lousada, era do mesmo ramo e odiava Hernandez Rivera.
Jamais vendeu nada para ele ou comprou, ao contrario, sempre que podia, convencia outros a não comercializar com o pai de Fernando, ou tornar o preço tão caro que poderia inviabilizar o negócio. Mas como ele era bilionário e louco por equinos de raça, ele sempre pagava. O fato de poder obter de forma criminosa o sêmen de um cavalo avaliado em 50 milhões de dólares, de um inimigo de seu pai, tinha para ele um sabor todo especial. Não se importava com cavalos, na verdade detestava o cheiro daqueles animais desde a infância. Evidente que jamais contou isso a família por questão de ama-los e valorizar sua herança, pois a mãe lutou muito para tê-lo aos 40 anos através de inseminação, e aos 70 anos morreu de câncer, mas estava feliz porque tinha deixado ele como a melhor parte de si; Portanto, jamais a magoaria e se tornou um ator naquilo que detestava.
Quanto ao pai, seguia a mesma linha, contudo sabia que o velho ainda viveria bastante, porque o vicio naqueles equinos era maior que qualquer doença que o atacasse, fingia adorar os cavalos por amor à família, mas agora estava interessado em outras coisas... Decidiu acrescentar em sua linha de leilões criminosos intocáveis exatamente isso, criar um haras com os cavalos de excelência do mundo, mas de animais novos, filhos dos melhores cavalos que não fossem do seu pai, afinal, ele era o herdeiro, e também possuía muitos que sequer jamais foi ver. Mas só o fato de ter que lutar contra uma rede de segurança dos donos esquizofrênicos com segurança, já era um bom motivo para isso, e a segunda era a vingança, afinal, mesmo detestando cavalos, ele amava o pai, e ninguém devia ficar impune ao aprontar com sua família...
Para dar sequencia a seu plano maquiavélico, lembrando-se um filme sobre dinossauros que viu quando criança, ele adquiriu diversas latas criogênicas disfarçadas como garrafas térmicas, refrigerantes e demais utilitários domésticos que pessoas comuns levavam para o trabalho e ninguém desconfiaria que fossem repositórios para sêmen fresco. A segunda ação foi cooptar uma rede de veterinários interessados em grandes somas de dinheiro em paraísos fiscais, por obter sêmen para clonagem, sem que os donos dos animais sequer imaginassem. Pagou 100 mil dólares pelo sêmen do cavalo que seu pai tanto queria e jamais pôde ter.... Inseminou duas de suas melhores éguas de raça, e meses depois, levou o pai para ver os filhos delas. Aos 80 anos, o velho não só tinha mais paixão por cavalos, como também era capaz de saber quem seria o pai, porque conhecia todos os cavalos mais caros do mundo.
Quando o velho viu os potros, sabia que o pai deles com certeza era o cavalo Cortez. Propriedade de seu eterno rival Rodrigo de Castilho Lousada, mas como seu filho teria conseguido o material genético para inseminação? Lousada tinha ódio mortal da famíliaRivera, era algo que nem deus podia curar... E ele não tinha chegado àquela idade sendo um completo inocente, sabia que Fernando praticava alguns negócios que não eram bem vistos, no entanto, ele era seu filho; e sua obrigação como pai era proteger seu herdeiro, e em muitos casos não buscar a verdade quanto às ações do rapaz porque saber certas coisas o obrigaria a fazer o que um pai jamais poderia...
Assim ele felicitou o garoto e se encantou pelos animais, recebendo o presente com muito mais orgulho porque pela primeira vez na vida, havia vencido seu oponente, seu filho também amava cavalos, e a melhor parte, ele jamais saberia que tinha sido vencido em seu próprio jogo. No registro eram filhos de um de seus garanhões que custavam milhões de dólares, e como ele era o 1º do mundo no seu ramo, sua palavra e histórico eram inquestionáveis. Nas publicações especializadas, seus novos cavalos chegaram ao mundo através da internet, mas por preço algum estariam à venda, seriam mantidos como reprodutores até que ele ou os cavalos morressem. Mas Fernando não ficou satisfeito, ele desejava algo mais nocivo e doloroso ao inimigo de sua família no ramo dos equinos, afinal ele se recorda de sua mãe sofrendo e consolando o pai por toda derrota que o algoz, Rodrigo de Castilho Lousada lhe infringia, e o quanto ela sofria por essa dor na família enquanto viveu, tinha morrido um ano atrás, e seu pai sofreu muito a perda dela; a resposta à dor foi se entregar mais aos animais.
Sabia que o cavalo Cortez, pai de seus potros estava viajando para uma exposição na argentina, e decidiu por uma ação que fizesse aquele homem sofrer uma dor tão profunda, que só quem ama seu ofício e profissão; muitas vezes superior à própria família, devia suportar... O veneno era uma opção, mas queria que fosse uma morte natural, invisível a uma autópsia e para isso tinha que ser algo bem especifico e indetectável, portanto não podia ser via oral. Ao mesmo tempo em que uma injeção deveria ser num local que não deixasse pistas... A mesma pessoa que lhe vendeu o sêmen lhe deu a solução, uma injeção de alta dose de potássio mataria o cavalo de ataque cardíaco sem deixar qualquer prova. Claro que ele queria um valor bem alto pelo feito, dois milhões de dólares, e como vingança não tem preço, Fernando pagou com prazer. Horas depois, Cortez, um dos mais lindos e caros cavalos do mundo estava morto. Seu dono, apesar de receber o seguro milionário pelo seu animal, estava inconsolável. Exigiu uma autopsia rigorosa de seu animal, mas a resposta era ataque cardíaco, uma fatalidade rara, mas que podia ocorrer, e neste caso ocorreu.
Rodrigo de Castilho Lousada era um homem velho, também com 80 anos, e a morte de seu garanhão preferido o abalou de uma forma que Fernando não imaginava, ele definhou como se fosse à morte de um filho, teve um ataque cardíaco poucas semanas após e morreu. Ele tinha 6 filhos, mas nenhum deles se interessava por cavalos, eram donos de empresas na Europa e Estados Unidos, e saber que o pai morreu por causa de um cavalo era o que faltava para por todos a venda e encerrar algo que não trazia boas lembranças. Eles jamais venderiam para a família que seu pai odiava, mas como era através de leilão, e um dos ‘empregados’ de Rodrigo era um hacker genial... Ele criou um personagem rico da Arábia saudita, e arrematou todos os animais pela internet. Os cavalos e o haras onde estavam foram adquiridos de porteira fechada. Após transferir os animais para o haras de seu pai, ele vendeu as terras para algumas construtoras. No final, mesmo pagando uma fortuna, ele pode dar ao pai tudo que o inimigo da família negou durante décadas.
Os Lousada, quando souberam para quem realmente tinham vendido, não ficaram nada satisfeitos, mas que haveria de fazer? Dono da maior coleção de cavalos nobres e raros do mundo, o pai de Fernando recebeu dos Árabes propostas bilionárias, afinal seus cavalos venciam todos os concursos e campeonatos mundiais. Mas ao contrario do que Fernando esperava, o excesso de trabalho e apego aos cavalos fez seu pai entrar em estafa e ter um ataque do coração. Quando sua alma estava pronta para deixar seu corpo, ele viu a figura de seu eterno algoz, Rodrigo de Castilho Lousada. Ele finalmente compreendeu que não eram inimigos, e sim pessoas que nasceram na mesma época e lugar, possibilitando um conflito pessoal que os estimulavam a lutar e viver. Sem um para contrabalançar o outro, ter tudo era só uma coisa vazia que nada representava, portanto morrer e renascer para nova batalha era a opção de uma nova vida...
Após a morte do pai Fernando estava inconsolável. Pior, seu desdém pelos cavalos era agora visível. Se não valessem bilhões de dólares, ele os mataria. Ele decidiu colocar todos à venda por um valor exorbitante, coisa rara e cara. Mas para os Árabes, que literalmente nadavam em petróleo, e sabiam que aquela oportunidade e prestigio jamais se repetiria em uma vida, não havia o que discutir. Após a venda, o rapaz aos 33 anos era um dos 6 homens mais ricos do mundo. Mas não tinha esposa, filhos, irmãos, nem pai nem mãe. Apenas tios e primos que ele jamais procurou ou se importou. Embora tivesse tudo pelo qual as pessoas passavam a vida inteira lutando para ter, tudo que ele possuía agora tinha o gosto vazio do nada. O que fazer para dar sentido à vida?