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CONTOS DE TERROR: A MALDIÇÃO DOS LANCASTER...

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Por David da Costa Coelho

      Algumas mulheres ao longo de sua vida, por serem muito mais do que a sua herança cultural, social e familiar permitem, acabam vivendo daquilo que construíram para seu mundo privado, e que mesmo ao custo de sua felicidade, devem manter em obrigação a quem lhes deu vida e futuro. Uma prisão sem grades, onde seu carcereiro é seu temor de mudanças, que lhe daria uma vida onde ela mesma faria as escolhas e pagaria o preço disto.

 
Luciana era uma mulher loira e linda, rica, independente, culta, formada em psicologia e jornalismo, católica, casada com um grande empresário do ramo editorial. Quem olhasse para a realidade em que vivia, devia imaginar que realmente foi agraciada com todos os dons divinos que Deus propicia a seus eleitos e escolhidos, no entanto, ela achava sua realidade um inferno. Era uma vida baseada na posição social, com festas hipócritas, pessoas frívolas e vazias, filhos que só não eram mais egoístas porque não podiam. Viam os pais apenas como receptáculos financeiros e de suas inconstâncias emocionais e vícios. Quanto ao marido, o fato de estarem anos casados, e o sexo louco dos primeiros dias ter se tornado apenas uma vaga lembrança daqueles tempos, havendo dia marcado durante a semana para o encontro sexual, fazia de sua vida intima tão hipócrita quanto às festas de amigos, das empresas e embaixadas que sempre eram convidados.
Pertencer à elite financeira, sendo de uma família tradicional católica refletia ainda mais essa angustia, porque no caso dela, a separação não era uma possibilidade, e sim um motivo de contenda familiar e religiosa, impossibilitando de recomeçar sua vida ao lado de um homem decente, supondo que isso existisse, porque descobriu a duras penas que são todos canalhas. Seu marido era um desses exemplos. Já havia lhe dito varias vezes que se o pegasse num ato de traição, certamente iria presa porque daria cabo da vida dele. Embora não tivesse nenhuma evidencia, como mulher, sabia naturalmente que o canalha se envolvia sexualmente com qualquer uma que lhe abrisse as pernas, nas inúmeras viagens que fazia pelo Brasil e exterior, com a desculpa de divulgar a empresa, ou visitas a novos fornecedores.
Ela formou-se jovem em jornalismo, e depois em psicologia para melhor trabalhar seus entrevistados, e quem sabe obter no futuro um programa de teve só dela, com auxilio de seu marido e amigos influentes dele.  Atuou num consultório por dois anos, tendo seus clientes de seu grupo social, ouvindo nas consultas as mesmas damas ricas e vazias, alguns homens também de seu nível, mas que estavam ali mais pela beleza dela, e por momentos de privacidade onde poderiam dizer coisas que talvez despertasse sua libido e lhes permitissem um momento sexual com ela. O que basicamente, devido seu treinamento na área e ódio a tais canalhas, se esquivava com a desculpa de ser casada e a separação entre psicólogo e paciente. Mas um determinado dia, quase na época em que fechou seu consultório e enterrou a profissão de psicóloga, conheceu uma cliente diferente. Era uma inglesa, do condado de Wiltshire, no Sul da Inglaterra, próximo ao monumento de [1]Stonehenge.
Procurou-a por indicação de amigas inglesas da embaixada, além de a psicóloga ser fluente na língua inglesa. O seu problema era simples, mas ao mesmo tempo complexo, e por serem da mesma casta social, mais fácil de entender, tendo ela já mais de 50 anos, embora aparentasse 30, precisava de alguém capaz de não só compreender o que ela passava, como também se por em seu ‘lugar’. Seu nome era Audrey Connor Lancaster, de uma família nobre e muito antiga. Contou durante a sessão parte de sua historia, onde seus familiares haviam cometido inúmeras atrocidades séculos atrás, no período da guerra [2]civil inglesa e dos [3]cercamentos. No entanto, ela não havia dito para Luciana o preço de carregar tal estigma, apenas que a maldição fazia com que ela fosse desejada e assediada pelos homens mais lindos e maravilhosos de seu país, e para aonde quer que fosse pelo mundo afora. Mas por mais que sua libido e liberdade permitissem, ela jamais podia sequer tocar outro homem devido à maldição dos Lancaster.
Ela não disse na sessão o que era a tal maldição, pediu apenas um favor ao final da consulta, momentos antes de partir, que lhe desse um abraço de despedida, porque iria para Londres no dia seguinte, que lhe olhasse nos olhos com sinceridade enquanto ela lhe diria umas frases em língua Druida, de uma casta de suas ancestrais femininas, em agradecimento por ser agora portadora de seus segredos e confiança eterna. Luciana conheceu vários tipos de terapia, dentre elas a [4]bioenergética, que possibilitava um contato físico com o paciente, portanto não achou nada demais em atender ao pedido de uma pessoa que lhe buscou para dar detalhes da vida que ninguém jamais saberia, e que ao final, sentiria-se bem com um abraço, placebo de libertação emocional em sua opinião acadêmica.
No dia seguinte, a caminho do escritório, já no elevador do prédio, foi literalmente devorada viva por um homem bem trajado que sempre lhe acompanhava neste horário de chegada, só que diferente dos outros dias, ela sentiu literalmente em sua mente o desejo dele, a ponto de seus pelos eriçarem, seus seios responderem, bem como os fluidos sexuais emanando de suas partes intimas, contagiando o ambiente; estimulando ainda mais as taras do homem. Por um motivo que ela desconhecia, foi com ele até o andar onde o mesmo possuía seu escritório. Desceram no mesmo andar sem se tocarem, tendo em vista que a mente de ambos agora se falavam com mais fluência do que as palavras humanas permitiam.
Ao adentrar no recinto, quando ele pôs as mãos em seu rosto, no segundo seguinte uma luz o envolveu, deixando de existir como pessoa, estava completamente dentro dela em forma de energia pura, com todo seu conhecimento, personalidade e juventude, mas apenas um ser a lhe servir, sem individualidade ou alma. Como parte essencial de um novo ser, feliz e constante. O advogado Roberto Antunes jamais desceria de seu escritório, nem seu corpo seria encontrado, como não havia câmeras nos corredores e elevadores, jamais saberiam nada sobre aquele desaparecimento. Ela, no entanto, retornou a seu escritório, agora completamente diferente, carregada de uma certeza que sequer sabia existir dentro de si desde seu primeiro orgasmo intenso de alma.
Aguardou sua atendente chegar, fez as contas dela pelo tempo que trabalhou, deu-lhe um cheque com uma quantia vultosa a titulo de amizade, e mandou a para o contador porque estava fechando o escritório. Pedindo antes que ela ligasse para todos os clientes, comunicando a informação por razões de saúde. Daquele dia em diante ela não mais recusava uma cantada, seja de qual homem fosse, devorando todos em lugares longes, fora dos olhos curiosos. Ela podia saber quando um homem lhe desejava desde que absorveu sua primeira alma, estava mais atraente, feminina, e jovem; restava um ultimo homem para seduzir e consumir, seu marido devasso.  
Em casa recebeu elogios dos filhos ao saber que não estava mais atendendo malucos de psiquiatria, e que estava mais preocupada com seu corpo ao entrar para academia. Mal sabiam eles que não era atrás de corpo perfeito e sim homens lindos e sarados, que ela devorava em locais ermos e distantes, em encontros secretos, longe dos olhos curiosos e tecnologia humana. No entanto, a vítima que ela ansiava cada dia mais em devorar, com um ódio e rancor profundo estava viajando, para isso ela realmente deixou seu corpo da mesma forma e desejo da época em que se conheceram, fazendo orgias sexuais por três anos antes do casamento. Ela parte ao encontro dele em Nova York, para lhe fazer uma surpresa, sabia onde ele estava porque o celular dele tinha GPS, ele estava num restaurante com uma roda de amigos, sem saber que ela tinha ido a seu encontro.
Discretamente ela coloca as mãos em seus olhos, e seu perfume já conhecido faz o marido ficar com os pelos eriçados, ao mesmo tempo que feliz por não estar acompanhado de ‘modelos’ após aquela reunião de negócios, como sempre fazia. Ao ver a sua esposa, com saúde e jovialidade de anos atrás, o que ele mais deseja naquele momento é se perder dentro dela, e o dela devorar o mesmo, tendo o para sempre como fonte de energia e controle. Mas não é o que ocorre, elas sobem para o quarto e transam durante horas. Quanto mais ela o deseja maior a potencia sexual dele, a ponto de no dia seguinte ela estar cansada e sentindo se mais velha, seu marido, no entanto, esta mais jovem, forte e potente, ela o observa enquanto dorme.
Irritada, deixa um bilhete na escrivaninha, despedindo-se, contando que foi uma noite de amor mágica, como não tinha há décadas, feliz, voltando para ficar com os filhos, ansiando o retorno dele. Mas na verdade estava com ódio por ter fracassado em seu intento magico, ao sair pela cidade, encontra um homem num bar, saem para um local mais sossegado atrás de um prédio e o devora, retomando parte de sua energia. Mas ela não entende como pôde devorar todos, mas não conseguiu consumir o marido canalha, ao contrário, comportou-se com ele na cama como uma rameira sexual no cio. Em seu inconsciente a resposta, pois sua mente agora traduzia as palavras na estranha língua:
"- Eu lhe dou meu poder e minha maldição, terás juventude eterna enquanto ficar longe de teu marido, e em hipótese alguma deve tentar contra a vida dele, nem ou fazer amor com ele, caso em contrario seu dom será uma maldição. Se dormir com ele, mesmo que uma única vez, toda sua energia vital será sugada por seu homem, envelhecerá rapidamente, se não sugar outra rapidamente para voltar ao estagio inicial de sua vida, no momento que falamos e herdou minha sina. Terás todas as consciências de suas vitimas assombrando sua mente, a ponto de destruir sua sanidade. Se não compreender minhas palavras, eu também morrerei e dividirei com você, assim como todas as hospedeiras anteriores, o mesmo destino que todos em sua mente, esta é a maldição dos Lancaster.”

Luciana agora compreendia perfeitamente seu ‘dom’, sabia druida porque Audrey Connor Lancaster também morava em seu corpo, assim como suas antepassadas. Audrey morreu dormindo em sua cama, em Londres, no mesmo dia que Luciana fazia amor com seu marido; no entanto, a morte não deixou sua alma livre para reencarnar, como pregavam os druidas em sua religião ancestral. Antes Luciana detestava sua vida pequena e medíocre, agora odiava, mas não tinha como se matar porque a maldição impedia, além de ter que matar todos os dias para poder viver, também dividia sua mente com os anseios e desejos dos milhares de fantasmas que todas destruíram ao longo de séculos, habitando nela. De posse de seu dinheiro em contas secretas, ela desaparece da vida dos filhões e esposo. Vaga pelo mundo, tendo que criar para si estereótipos que lhes permitam viver e sugar vidas que em nada lhes satisfazem, pelo simples motivo do mundo ilusório ser maior do que a mentira real que vivem. Para escapar da maldição, ela teria que fazer o mesmo ritual dos Lancaster, com alguém que entendesse druida antigo, ou viver por toda eternidade com sua eterna maldição acompanhada. 
Essa era de longe a maior dádiva de um amaldiçoado, viver sua maldição pessoal, ou passar a eternidade em lamurias na mente do novo escolhido...


[1] Stonehenge é um sítio arqueológico pré-histórico. A estrutura principal é formada por dois anéis de monólitos de pedra, construídos a partir de 3100 A.C., provavelmente para executar rituais religiosos. O anel externo tem cerca de 86 metros de diâmetro e o interno, 30 metros, em média. A arquitetura dos anéis tem relação com os movimentos do Sol e da Lua e alguns monólitos possuem cerca de 9 metros de altura. Stonehenge recebe cerca de 700 mil visitantes por ano.

[2] A guerra civil inglesa, que se iniciou no ano de 1642 até 1649, teve diversas causas. No nível mais simples, a guerra foi provocada por uma disputa de poder entre as forças do conservadorismo, representada pelo rei impopular, Charles I, e aqueles que procuram uma constituição mais moderna, dirigida por membros do Parlamento. Além disso, o rei Charles casou-se com Henriqueta Maria da França, que era católica, mas o país era protestante, então muitas pessoas acreditavam que ele iria mudar a religião do país para católica, o que eles não queriam. Charles também gastou todo o dinheiro dos impostos do povo com pinturas e roupas para sua família, ao invés de investir no país.

[3] Foi quando a nobreza inglesa, desde o século XVI, começou a expulsar os camponeses de suas terras. Ela se apropriou das terras comunais, antes cultivadas pelos camponeses, nas quais passou a criar ovelhas (lã) ou cultivar cereais para atender ao mercado. Essa espoliação de terras comunais, conhecido como "cercamentos" ou enclousures, gerou uma massa de camponeses sem terras, os quais se deslocaram para as cidades e se transformaram em trabalhadores assalariados. Isso contribuiu para que as nascentes indústrias inglesas tivessem à sua disposição uma mão-de-obra abundante e barata.

[4] A Análise Bioenergética foi criada a partir do trabalho de Wilhelm Reich. O Dr. Alexander Lowen foi paciente e estudante de Wilhelm Reich. A bioenergética pregada por ele tem sua origem no método psicanalítico do famoso Dr. Sigmund Freud. Trata, em resumo, de psicanálise, de exercícios físicos, de respiração. Ela combina de uma maneira única os princípios fundamentais da psicanálise com o trabalho direto, nos níveis somáticos do desenvolvimento e da relação cliente paciente...

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