Autor: David da Costa Coelho
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Dona Patrícia, mãe da pequena Estela, mais conhecida como chapeuzinho vermelho por usar esse gorro sempre que estava frio, recebeu da sua mãe a incumbência de visitar o sitio da sua avó, para levar alimentos e remédios porque ela morava muito longe, depois de uma mata fechada e escura... Como o caminho para o sitio era muito perigoso, ela pediu que chapeuzinho tomasse muito cuidado e fosse direto, não parando para dar atenção a ninguém estranho, no entanto sem ela saber, havia um lobo encantado por uma bruxa, desejoso de se tornar um ser humano e poder viver como tal, ansioso por uma criança pura e inocente, pronta para ser devorada e dar a ele a tão sonhada humanidade.
O feitiço da bruxa permitia que as crianças simples o vissem como ser humano, mas os adultos o viam como tal, perverso e assassino, bastando só a ocasião para isso, e queriam mata-lo porque a final de contas ele era um lobo, matando ovelhas, gado e ate mesmo pessoas velhas, novas ou crianças que se aventuravam na escuridão da floresta. A bruxa havia lhe dito que se ele não se transformasse em ser humano ate o final do ano, devido a um pacto de bruxaria que fizeram, já que ele lhe auxiliou como criatura livre e feroz no feitiço que aumentou os poderes dela, ele morreria como lobo e perderia seu dom de encantar as crianças, e para se transformar em humano eternamente ele deveria matar uma criança ingênua, sem que ela percebesse que essa era sua intenção.
Assim sendo cada dia perdido para o lobo significava que seu sonho de ser humano ficava muito mais distante, sabendo disso ele correu por um atalho é derrubou varias arvores utilizando um machado em sua forma humana, invocada porque era para enganar uma criança inocente, e sempre que fosse para tal coisa ele assumia a forma humana, um dos dons mágicos que a bruxa lhe dera, e que estava para terminar se o intento magico não fosse cumprido na data prevista. Quando chapeuzinho pegou o caminho para ir à casa da sua avó, a estrada estava interditado e ali existia um homem cortado à lenha que estava no meio do caminho. Apesar de a sua mãe ter-lhe dito pra não falar com estranhos, ela agora não tinha opção, e lhe perguntou:
- Bom dia senhor lenhador, eu me chamoEstela e estou indo pra casa da minha avó, mas o caminho esta bloqueado, o que aconteceu aqui?
O lenhador responde:
- Bom dia menina, ontem a noite ocorreu uma ventania terrível e diversas arvores caíram, eu estou retirando a madeira para que as pessoas possam passar novamente, é isso levara uns três dias, mais se me disser pra onde tu vais talvez eu conheça um atalho, pois moro nesta floresta há décadas e sei todos seus caminhos.
- Bom eu vou pra casa da minha avó Lupita que fica depois daquela colina, muito acima da floresta.
- Há então é fácil - diz o lobo – basta seguir por este atalho e em pouco tempo estará na casa da senhora sua avó. E como é um caminho meio perigoso, com cobras, javalis, lobos e bandidos, leve esta faca para o caso de surgir algum perigo, e não pare para ninguém, afinal a sua avó não pode esperar mais...
Estela aceita o presente é parte rapidamente para casa da sua avozinha, enquanto o lobo corre em direção à casa da vovó Lupita, e ao fazer isso volta a ser um lobo porque sua intenção era maligna, e correndo em velocidade imensa, pois ele agora era um ser magico; e para sua sorte, a velha senhora se encontra do lado de fora da casa recolhendo verduras para o jantar. O lobo pula encima dela, fazendo com que a velha senhora caia e bata a cabeça numa pedra, já mortalmente ferida, arrasta o corpo ate uma gruta, consumindo sua carne e seus ossos completamente, com a fome que só a magia consegue suportar, embora não saiba aquela será sua ultima refeição e maldição...
Ele volta para o caminho da casa de Lupita e percebe ao longe os passos de chapeuzinho se aproximando, com seus instintos de ser da floresta ele volta à forma humana, entrando na casa da vovó, rapidamente colocando as roupas dela, já estava escurecendo e era uma noite sem lua, e para impedir que chapeuzinho lhe reconhece-se sua voz e seu corpo, ele acendeu apenas uma lamparina e a casa ficou em penumbras.
Chapeuzinho finalmente chega e bate a porta e grita:
- Vovó, vovó abre a porta sou euEstela!
- Entre minha netinha, a porta só esta encostada, estou aqui deitada na minha cama com muito frio e passando mal, porque você demorou tanto?
- Tive que vir por outro caminho vovó porque havia árvores bloqueando a estrada, por que esta tão escuro aqui?
- Porque estou doente e não pude cortar lenha, nem comprar velas e querosene para as lamparinas na vila, eu já comi mais cedo antes de me deitar, então coma alguma coisa da cesta que sua mãe mandou e venha se ajeitar aqui comigo pois amanha eu vou contigo pra a casa da sua mãe e nos compraremos o que falta.
Ao deitar-se na cama com sua avó, chapeuzinho percebeu que ela estava mais forte e lhe falou:
- Vovó, a sua voz esta mais grave, seu corpo mais forte, e ate seu rosto esta arranhando o meu, por que isso?
O lobo responde:
- Olha minha netinha estou mais forte porque carrego muita lenha da floresta, minha voz esta roca porque estou doente há dias, e meu rosto esta te arranhando porque estou suja de fuligem do fogão a lenha, mas assim que amanhecer, tomarei um banho bem quente, comeremos alguma coisa no café da manhã e iremos embora para casa da minha filha, com certeza ela deve estar muito preocupada com você, assim como eu fiquei pela sua demora...
Nesse momento chapeuzinho percebeu que havia algo errado e deixou de ser uma criança inocente. O corpo do lobo voltou a sua forma original, mas ele não percebeu que ela havia perdido a infância, e sem isso, não havia feitiço que impedisse a menina de ver a verdade, no entanto Estela agora tinha certeza de que aquela criatura ali não era sua avó, em seu intimo ela sabia que sua avozinha estava morta e que se não fizesse nada, também seria morta e devorada por aquele animal maldoso e cruel. Lembrou então da adaga que o bondoso e sábio lenhador lhe dera no caminho é tinha colocado oculto na sua cintura, e que nesse momento em que estava deitada na cama lhe incomodava por baixo do vestido, no entanto era sua única esperança de continuar viva; Apesar do medo, ela pegou a faca e posicionou embaixo do travesseiro.
Ai ela finalmente perguntou ao lobo de forma inocente para que a reação dele lhe permitisse um ataque mortal:
- Vovozinha para que esses dentes tão grandes?
- É para te comer e me tornar humano.
Quando ele vai mordê-la no pescoço e concretizar o feitiço, sente uma pontada dilacerando seu coração, chapeuzinho vermelho havia enterrado a faça no peito do lobo, matando o animal encantado em segundos. No dia seguinte ela encontrou os restos das roupas de sua avó e os rastros de sangue dela em direção a gruta, levou os trapos ensanguentados ate a cabana e junto com o corpo do lobo, ela ateou fogo no animal e nos moveis, assim libertava o espírito da sua avó; Preso até então dentro do corpo do lobo, é o animal teria para sempre sua alma maléfica mantida eternamente no local, pois onde tinha sido a casinha da vovó, agora restava apenas um monte de cinzas amaldiçoadas e nada nasceria ali. A criatura medonha jamais poderia fazer mal a nenhuma outra criança inocente.
Para uma criatura que corria livre pela floresta, ficar com a alma presa entre o mundo dos vivos e dos mortos, sem poder se deslocar para nenhum deles, nem ao menos como um fantasma da floresta em comunhão com os demais, aquela era a maior punição que um ser magico poderia suportar, e que jamais desejaria...
Para uma criatura que corria livre pela floresta, ficar com a alma presa entre o mundo dos vivos e dos mortos, sem poder se deslocar para nenhum deles, nem ao menos como um fantasma da floresta em comunhão com os demais, aquela era a maior punição que um ser magico poderia suportar, e que jamais desejaria...
Quanto a chapeuzinho, Estela cresceu, casou, teve seus filhos e netos, mas jamais encontrou o bondoso lenhador que lhe indicou o caminho da casa da sua avó e também salvou sua vida, com certeza ele estaria já bem velhinho e ainda cortando madeira para construir as coisas que amava, mas ele sempre estava em suas memórias como alguém bondoso e prestativo; E sempre que ia à floresta, levava o punhal que salvou sua vida, pois certos presentes que recebemos, são realmente a diferença entre viver e morrer, e a floresta ainda tinha perigos...